O Sentido Lúdico e o Ato Criativo
A palavra LÚDICO tem origem no latim: LUDUS, que é jogo, e remete a divertimento e ao brincar. E para que compreendamos melhor esta ideia do divertimento que traz uma atividade lúdica, é bom que analisemos primeiro, o conceito de “jogo”, em sua essência. Jogar implica em relacionamento, mas não necessariamente entre duas pessoas.
Jogamos quando provocamos algo ou alguém, com um determinado estímulo para obter uma resposta! Em síntese, jogo é: “estímulo e resposta”. E para além desta síntese, o jogo, seja de que natureza for, está sempre ligado à alma de um povo, aos seus gostos, saberes, modo de ser e viver. Sempre surge para satisfazer o desejo de diversão e prazer de uma determinada sociedade, com suas características, que expressam seus símbolos e sentir.
Observando de um prisma mais pessoal, a diversão está ligada ao temperamento do indivíduo, como ele é por dentro e como estabelece suas trocas afetivas, tudo o quê lhe afeta! O quê diverte um, pode aborrecer outro. Assim, a diversão está ligada à alma, à cultura e à forma como uma pessoa cria e se relaciona com o seu universo social e pessoal. O jogo está ligado também ao desejo de conquista e evolução, pois o interesse em um jogo perdura, enquanto houver o desafio, a expectativa do inesperado.
Quando as pessoas dominam de tal forma as estratégias, que as “jogadas” são previsíveis, acaba o interesse, o jogo perde a graça! O encanto está no mistério, em estar sempre descobrindo algo novo e ir aprendendo sempre mais, crescendo, aprimorando as habilidades para conquistar um resultado cada vez melhor!...
Bem, isto é, a grosso modo, a essência do jogo em si, mas o que nos interessa aqui é o sentido lúdico do ser humano, que envolve muito mais questões, que um jogo criado e estabelecido com suas regras para divertir ou educar.
A análise feita do jogo aqui é importante na medida em que serão os mesmos aspectos humanos envolvidos no ato de jogar, os que norteiam e nutrem o sentimento lúdico, que a meu ver, é tão essencial à experiência da felicidade, como algo a ser vivido no dia a dia e não como uma meta a ser conquistada a médio ou longo prazo, subjugada a uma série de condições preestabelecidas. De forma mais ampla, pode se dizer que “sentido lúdico” é a capacidade, inerente ao ser humano, de se divertir e ter prazer nas interações e trocas com o meio em que vive, com leveza e bom humor, envolvendo-se de corpo e alma.
E o que seria uma ação de corpo e alma? Do que estou falando afinal? Refiro-me àquela ação que não se restringe apenas ao pensamento lógico, mas também aos sentimentos, emoções, impressões e sensações. Este tipo de envolvimento é essencial ao ato criativo. E o que o ato criativo tem a ver com o sentido lúdico? Ao criar interagimos, “jogamos”, com algum material, seja ele concreto, como tintas, papel, tecido, madeira, etc... ou abstrato como ideias, música, palavras, poesia... Provocamos um estímulo e recebemos uma resposta, que não sabemos à priori, qual será! O outro, o próprio material utilizado ou aquele que observa ou desfruta a nossa obra já pronta, é o que nos dá a medida do nosso estímulo, da nossa “provocação”.
Neste ponto, é o momento de parar, contemplar e absorver... sentir o gosto de todo o processo, sem análise, sem a interferência do julgamento, apenas sentir... Então, surge um outro tipo de prazer: o da realização, que é silencioso, mas muito, muito completo e pleno de respostas!
Sonia Medeiros Malabar